quarta-feira, 5 de agosto de 2009
Barulhinho ruim
Apesar de todo o investimento e grifes, álbuns de cantoras têm resultados abaixo da crítica
Um grande investimento técnico agrega valor artístico a um disco a ponto de torná-lo bom? Cada um a sua maneira, os novos CDs da veterana Ana Carolina e das novatas Ana Cañas e Maria Gadú respondem -com um "não"- a essa pergunta.
Os lançamentos estão sendo tratados à moda antiga por suas respectivas gravadoras, com a mesma pompa dos tempos em que a indústria vendia muitos discos e, de volta, tinha bom dinheiro para gastar com eles.
Nos três casos, os altos investimentos saltam aos olhos já nos encartes -seja pela qualidade gráfica, seja pelo desfile de nomes estrelados nas fichas. Produtores "hypados" foram escalados, nomes consagrados assinam parcerias, astros internacionais fazem duetos, fotógrafos de moda clicam as capas.
Ao que parece, mais do que buscar afinidades reais entre as cantoras, seus convidados e equipes técnicas, a preocupação aqui parece ter sido conquistar a credibilidade por meio da ostentação de grifes.
E o resultado musical ficou abaixo da crítica.
Produções escondem particularidades das cantoras com grifes
Com altos investimentos, CDs de Ana Carolina, Maria Gadú e Ana Cañas expõem repertório autoral imaturo
Pode-se dizer que a produção musical de um álbum foi bem executada em duas circunstâncias. Quando, preocupada em trazer a primeiro plano a personalidade do artista, ela não se deixa notar e se torna invisível. Ou quando, ao contrário, dá um jeito de aparecer com mais intensidade que o próprio artista, preenchendo o vazio causado pela falta de personalidade dele.
Os lançamentos das cantoras Ana Cañas, Maria Gadú e Ana Carolina misturam essas situações de forma esquizofrênica.
No caso de Cañas e Gadú, atuais apostas das gravadoras Sony e Som Livre, o problema parece ter vindo de cima. A produção esmerada dos respectivos álbuns importa-se pouco em trazer à tona a novidade, os talentos que essas mesmas artistas já demonstraram em apresentações ao vivo.
Preferiram investir no hype e formatá-las em padrões de qualidade do antigo mercado, adornando o "produto" com nomes reconhecíveis pelo público consumidor.
Marisa Monte
A estreante Gadú, 22, vem arrebanhando fãs entusiasmados na imprensa carioca, principalmente por seu carisma cênico. Mas ele não aparece no recém-lançado "Maria Gadú".
Repleta de contracantos e "laialaês", a produção de Rodrigo Vidal mais evidenciou a impressionante semelhança vocal entre Gadú e Marisa Monte do que tentou detectar particularidades da artista que nascia.
Já que era para seguir os ensinamentos da veterana, os produtores poderiam ter aconselhado Gadú a não expor tão cedo seu repertório autoral, ainda um tanto imaturo. Marisa não soltou nenhuma canção de própria lavra até que estivesse devidamente estabelecida por seu maior trunfo: a voz.
Vanessa da Mata
Segundo Alexandre Schiavo, presidente da Sony Music, muitas das estratégias usadas agora para alavancar a carreira de Ana Cañas, 28, foras aprendidas com outra artista da gravadora: Vanessa da Mata.
Talvez por isso, Liminha, responsável por álbuns de Vanessa, tenha sido recrutado para dar a pegada roqueira de "Hein?", esse segundo trabalho de Cañas. O produtor também assina parcerias em oito de suas 12 faixas.
Arnaldo Antunes fez as letras de cinco delas. Por um lado, sua presença minimiza as críticas negativas que as composições autorais do álbum de estreia da cantora receberam. Por outro, a quantidade ostensiva em que essas parcerias aparecem agora gera a suspeita de que ela esteja tentando pegar onda na grife.
Em "Nove", novo CD de Ana Carolina, 34, esse contraste fica ainda mais óbvio. É constrangedora a diferença entre a letra composta com Gilberto Gil e as que Carolina fez com sua turma.
A começar por sua capa, digamos, conceitual, o disco inteiro tenta maquiar com uma vestimenta "cult" a inegável vocação ultrapopular da cantora.
A produção, que ficou por conta dos hypados Kassin (Orquestra Imperial, Caetano Veloso), Mario Caldato (Beastie Boys, Bebel Gilberto) e Alê Siqueira (Tom Zé, Arnaldo Antunes), buscou tanto quanto pôde conter os arroubos vocais da cantora, famosa por se importar mais com volume que com interpretação. Não fez milagre.
Vanessa da Mata também serviu de modelo aqui. O formato de seu hit "Boa Sorte (Good Luck)", criado em dueto com Ben Harper, foi decalcado por Carolina em "Entreolhares (The Way You're Looking at Me)", dueto com o cantor americano John Legend.
Além de Legend e de Gil, a cantora e baixista de jazz americana Esperanza Spalding também comparece no álbum. Como talento e aura cult não são transmissíveis como o vírus da gripe suína, fazem pouca diferença no resultado final do trabalho -popular no talo, como todos os seus anteriores. Feito esses, deve vender muito.
Fonte: Folha de São Paulo (05/08/09)
Um grande investimento técnico agrega valor artístico a um disco a ponto de torná-lo bom? Cada um a sua maneira, os novos CDs da veterana Ana Carolina e das novatas Ana Cañas e Maria Gadú respondem -com um "não"- a essa pergunta.
Os lançamentos estão sendo tratados à moda antiga por suas respectivas gravadoras, com a mesma pompa dos tempos em que a indústria vendia muitos discos e, de volta, tinha bom dinheiro para gastar com eles.
Nos três casos, os altos investimentos saltam aos olhos já nos encartes -seja pela qualidade gráfica, seja pelo desfile de nomes estrelados nas fichas. Produtores "hypados" foram escalados, nomes consagrados assinam parcerias, astros internacionais fazem duetos, fotógrafos de moda clicam as capas.
Ao que parece, mais do que buscar afinidades reais entre as cantoras, seus convidados e equipes técnicas, a preocupação aqui parece ter sido conquistar a credibilidade por meio da ostentação de grifes.
E o resultado musical ficou abaixo da crítica.
Produções escondem particularidades das cantoras com grifes
Com altos investimentos, CDs de Ana Carolina, Maria Gadú e Ana Cañas expõem repertório autoral imaturo
Pode-se dizer que a produção musical de um álbum foi bem executada em duas circunstâncias. Quando, preocupada em trazer a primeiro plano a personalidade do artista, ela não se deixa notar e se torna invisível. Ou quando, ao contrário, dá um jeito de aparecer com mais intensidade que o próprio artista, preenchendo o vazio causado pela falta de personalidade dele.
Os lançamentos das cantoras Ana Cañas, Maria Gadú e Ana Carolina misturam essas situações de forma esquizofrênica.
No caso de Cañas e Gadú, atuais apostas das gravadoras Sony e Som Livre, o problema parece ter vindo de cima. A produção esmerada dos respectivos álbuns importa-se pouco em trazer à tona a novidade, os talentos que essas mesmas artistas já demonstraram em apresentações ao vivo.
Preferiram investir no hype e formatá-las em padrões de qualidade do antigo mercado, adornando o "produto" com nomes reconhecíveis pelo público consumidor.
Marisa Monte
A estreante Gadú, 22, vem arrebanhando fãs entusiasmados na imprensa carioca, principalmente por seu carisma cênico. Mas ele não aparece no recém-lançado "Maria Gadú".
Repleta de contracantos e "laialaês", a produção de Rodrigo Vidal mais evidenciou a impressionante semelhança vocal entre Gadú e Marisa Monte do que tentou detectar particularidades da artista que nascia.
Já que era para seguir os ensinamentos da veterana, os produtores poderiam ter aconselhado Gadú a não expor tão cedo seu repertório autoral, ainda um tanto imaturo. Marisa não soltou nenhuma canção de própria lavra até que estivesse devidamente estabelecida por seu maior trunfo: a voz.
Vanessa da Mata
Segundo Alexandre Schiavo, presidente da Sony Music, muitas das estratégias usadas agora para alavancar a carreira de Ana Cañas, 28, foras aprendidas com outra artista da gravadora: Vanessa da Mata.
Talvez por isso, Liminha, responsável por álbuns de Vanessa, tenha sido recrutado para dar a pegada roqueira de "Hein?", esse segundo trabalho de Cañas. O produtor também assina parcerias em oito de suas 12 faixas.
Arnaldo Antunes fez as letras de cinco delas. Por um lado, sua presença minimiza as críticas negativas que as composições autorais do álbum de estreia da cantora receberam. Por outro, a quantidade ostensiva em que essas parcerias aparecem agora gera a suspeita de que ela esteja tentando pegar onda na grife.
Em "Nove", novo CD de Ana Carolina, 34, esse contraste fica ainda mais óbvio. É constrangedora a diferença entre a letra composta com Gilberto Gil e as que Carolina fez com sua turma.
A começar por sua capa, digamos, conceitual, o disco inteiro tenta maquiar com uma vestimenta "cult" a inegável vocação ultrapopular da cantora.
A produção, que ficou por conta dos hypados Kassin (Orquestra Imperial, Caetano Veloso), Mario Caldato (Beastie Boys, Bebel Gilberto) e Alê Siqueira (Tom Zé, Arnaldo Antunes), buscou tanto quanto pôde conter os arroubos vocais da cantora, famosa por se importar mais com volume que com interpretação. Não fez milagre.
Vanessa da Mata também serviu de modelo aqui. O formato de seu hit "Boa Sorte (Good Luck)", criado em dueto com Ben Harper, foi decalcado por Carolina em "Entreolhares (The Way You're Looking at Me)", dueto com o cantor americano John Legend.
Além de Legend e de Gil, a cantora e baixista de jazz americana Esperanza Spalding também comparece no álbum. Como talento e aura cult não são transmissíveis como o vírus da gripe suína, fazem pouca diferença no resultado final do trabalho -popular no talo, como todos os seus anteriores. Feito esses, deve vender muito.
Fonte: Folha de São Paulo (05/08/09)
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Um comentário:
Eita! Colocou pra F de Felicidade...
Pôxa...não dava para pegar mais leve não?
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